
Como alcançar a neutralidade carbónica na iluminação pública
Estudo recente do ISEL e Bright Science demonstra a viabilidade técnica e económica dos sistemas híbridos de energia solar fotovoltaica com armazenamento de energia em baterias para iluminação pública sustentável.
O Pacto Ecológico Europeu estabeleceu como metas reduzir em 55% as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) até 2030, em comparação com os níveis de 1990, e alcançar a neutralidade climática até 2050. Para atingir estes objetivos, o Roteiro Nacional de Baixo Carbono traça as “opções de transição para uma economia de baixo carbono competitiva em 2050”, impondo transformações em diversos setores da economia para diminuir o consumo de energia e minimizar o impacto climático.
Este desígnio ambiental levou várias entidades, públicas e privadas, a procurar opções sustentáveis de produção energética, como a instalação de pequenas centrais fotovoltaicas para autoconsumo.
Produção descentralizada de energia para autoconsumo
O autoconsumo fotovoltaico permite produzir energia limpa no próprio local de consumo, através de painéis solares. Reduz custos, promove a autonomia energética e contribui para a sustentabilidade.
O princípio é simples. Os painéis solares produzem energia elétrica limpa e gratuita durante o período diurno (nas horas em que há sol) e a rede elétrica fornece a energia em falta, nomeadamente durante o período noturno, quando os painéis não estão a produzir. Cada quilowatt-hora de eletricidade gerado por uma central fotovoltaica reduz a necessidade de energia proveniente de fontes não renováveis, diminuindo a dependência de combustíveis fósseis e contribuindo diretamente para reduzir as emissões de GEE e descarbonizar a economia, com menores custos de produção.
Sistemas de abastecimento híbrido na iluminação pública
Mais de metade do consumo elétrico nos municípios é para alimentar a rede de iluminação pública (IP) – podendo mesmo atingir os 70%, em alguns casos. No entanto, como o consumo de IP acontece precisamente no período noturno, em que não há sol para alimentar os painéis fotovoltaicos, encontramo-nos perante uma limitação do uso da solução fotovoltaica para reduzir o consumo elétrico dos municípios. Ou talvez não.
Do ponto de vista tecnológico é possível resolver o problema adicionando mais uma peça ao puzzle: um Sistema de Armazenamento de Energia por Baterias, ou BESS (Battery Energy Storage Systems). Este sistema funciona como um “banco de energia”, permitindo, justamente, armazenar a energia capturada pelos painéis fotovoltaicos durante o dia para a utilizar durante o período noturno. Esta solução abre o caminho para os municípios se tornarem (praticamente) autónomos da rede elétrica.
E o quadro legal é favorável à sua implementação. Com as alterações efetuadas ao DL50/2021 já é possível juntar projetos de eficiência energética à produção de energia renovável, sendo portanto extremamente oportuno combinar a transição para iluminação pública LED com estes sistemas de abastecimento hibrido para reduzir drasticamente as emissões de carbono e os custos de produção de energia.
Qual a rentabilidade da solução?
Foquemo-nos então numa das vertentes mais importantes de um projeto desta natureza – os sistemas híbridos de painéis fotovoltaicos e sistema de armazenamento de energia (BEE) são economicamente viáveis na iluminação pública? Para responder a esta questão foi realizado um estudo [1], em que participei com uma equipa de investigadores do departamento de Electricidade, Energia e Automatação do ISEL. Este estudo, publicado no final de maio de 2025 na conferência European Energy Markets (EEM25), analisou, precisamente, a rentabilidade económica de uma solução híbrida (fotovoltaico + BESS) para a iluminação pública de um município.

Os resultados da análise mostraram as condições de viabilidade económica dos sistemas híbridos, em função do preço dos equipamentos e exposição solar. A rentabilidade é alcançada com um custo de instalação de painéis solares até 1200 €/kW e baterias até 300 €/kWh. Num cenário base com 5,4 MW de potência fotovoltaica e 29,2 MWh de armazenamento, foi possível atingir uma autossuficiência energética de 68% e uma poupança anual de 333 mil euros face ao fornecimento exclusivo pela rede. No verão, o sistema garante autossuficiência energética total, com produção excedente que pode ser vendida à rede; no inverno, é necessário recorrer parcialmente à rede elétrica, não sendo economicamente viável uma solução 100% autossuficiente.
Se, por um lado, os preços dos painéis solares fotovoltaicos têm reduzido significativamente nos últimos anos, relativamente aos BESS estamos ainda no início, pelo que as condições de rentabilidade são ainda muito dependentes do preço das baterias, em especial para projetos de maiores dimensões. Mas, por outro lado, os preços das baterias em 2024 desceram bastante mais que os analistas inicialmente previram, claramente um sinal de que, a curto prazo, a rentabilidade destes investimentos será ainda mais alargada.
Conclui-se, portanto, que com a tecnologia já disponível e a regulação em vigor, estamos muito perto de tornar neutra em carbono a iluminação pública dos nossos municípios.
[1] “Integration of Solar PV and Battery Energy Storage Systems Towards a Sustainable Street Lighting” de M. Lima, S. Perinhas, J. Sousa, C. Viveiros e F. Barata
Miguel Allen Lima
ARQUILED CEO